A Faixa de Gaza, palco da guerra que já dura mais de 70 dias entre Israel e o grupo palestino armado Hamas, deverá enfrentar um desastre ambiental durante muitas décadas.
“Em qualquer guerra e conflito, o rastro tóxico que é deixado ao longo das gerações após o silêncio das armas estará presente, devido à gestão de detritos, às instalações petrolíferas e aos esgotos”, disse Inger Andersen, diretora executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA, na sigla em inglês), à agência Anadolu (AA). “Onde colocar os destroços é um problema para todas as cidades que foram bombardeadas. Este será certamente um problema para o povo de Gaza.”
A PAX for Peace, uma organização sediada nos Países Baixos, realizou um estudo rápido de avaliação ambiental na região. Wim Zwijnenburg, um dos principais autores, relatou que as condições básicas necessárias para a vida em Gaza foram “seriamente degradadas” pela campanha militar de Israel.
Segundo ele, partes do território se tornarão inabitáveis durante os próximos anos, e talvez décadas. E, no primeiro nível de preocupação estão os riscos agudos para a saúde pública, sobretudo por conta da fumaça das fábricas bombardeadas e a queima de plásticos e outros materiais de embalagem, que expõe as pessoas a substâncias perigosas.
Na sequência, aparecem os impactos públicos e ambientais diretos e indiretos, incluindo danos aos recursos hídricos, fazendo com que a população não tenha acesso a água potável e saneamento, e às infraestruturas energéticas.
O terceiro ponto de preocupação, disse Zwijnenburg, são os conflitos de médio e longo prazo e os riscos ambientais decorrentes dos escombros, da falta de gestão de resíduos e dos impactos agrícolas.
Tudo isso poderá resultar em doenças, com alto risco de cólera e problemas gastrointestinais.
Aumento nas emissões de carbono
Gaza vive sob a batuta de Israel há quase duas décadas. Como resultado disso, para manter um acesso confiável a combustível e energia, a população recorreu significativamente à energia solar para abastecer as suas casas.
“A população de Gaza adaptou-se ao clima e cerca de 60% da sua energia vinha da energia solar”, relatou Nada Majdalani, diretora palestiniana da EcoPeace Oriente Médio, à rede Al Jazeera.
O problema é que os bombardeios israelitas danificaram ou destruíram milhares de edifícios, muitos deles cobertos com painéis solares. “Destruir os painéis solares não impacta apenas o bem-estar das pessoas, mas também diminui os esforços dos habitantes de Gaza na adaptação climática e nas medidas para garantir energia limpa. Estas instalações solares estão agora em ruínas, com os edifícios destruídos, atrasando os esforços de Gaza em matéria de alterações climáticas”, observou Majdalani.
Outra fonte de preocupação é que a tensões locais estão se expandindo para o Mar Vermelho, um importante centro de biodiversidade marinha e que poderá ser seriamente impacto.
Mais um item na lista é o aumento nas emissões de carbono que contribuem para o aquecimento global. A questão é que essa guerra, como outras anteriores, requer grandes quantidades de combustíveis fósseis, os maiores inimigos do clima.
Análises sugerem que 25 mil toneladas de munições foram lançadas sobre Gaza nas primeiras semanas do conflito. As emissões de carbono disso equivaleriam ao uso anual de energia de aproximadamente 2.300 residências ou às emissões anuais de gases de efeito estufa (GEE) de aproximadamente 4.600 veículos de passageiros, informa a Al Jazeera.
As forças militares mundiais também utilizam combustíveis fósseis para operar aeronaves, tanques e armas, representando aproximadamente 5,5% das emissões globais – mas esse número pode ser maior, pois as forças de defesa não são obrigadas a comunicar as suas emissões.
Além disso, grupos como a Human Rights Watch também acusaram Israel de usar munições de fósforo branco em Gaza, o que aumenta ainda mais a poluição na atmosfera. “À medida que Gaza entra na estação chuvosa, esperamos que a chuva caia como chuva ácida, contaminada com fósforo branco”, observou Majdalani.
Diante deste cenário, as pessoas que coletam água da chuva para beber podem estar particularmente em risco.
Reconstrução também será problema
Com tanta destruição e ameaças, até mesmo a reconstrução da Faixa de Gaza será problemática por causa das emissões. “A produção de concreto e cimento para reconstrução gera uma grande quantidade de dióxido de carbono, o que contribui para a crise climática”, comentou Doug Weir, diretor do Observatório de Conflitos e Ambiente, um organismo de investigação independente com sede no Reino Unido.
Lennard de Klerk, da Initiative in GHG Accounting of War, fez um cálculo aproximado de quanta emissão de GEE resultaria da reconstrução apenas de edifícios residenciais e não residenciais que foram destruídos ou danificados após as primeiras seis semanas da guerra.
Pelas suas projeções, “5,8 milhões de toneladas de emissões de carbono seriam liberadas para produzir materiais de construção e as emissões das próprias atividades de construção”.
Fonte:https://umsoplaneta.globo.com/sociedade/noticia/2023/12/24/faixa-de-gaza-enfrentara-desastre-ambiental-durante-decadas-por-conta-da-guerra.ghtml
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