ORNITÓLOGO CONSEGUE IDENTIFICAR ESPÉCIES DE PÁSSAROS OUVINDO O SOM

Com a ajuda de Luciano Lima, o Globo Repórter entra na selva para encontrar os belos pássaros da Mata Atlântica.



Nossa expedição avança por terra. Estamos cercados de floresta. Os animais não conhecem os limites da mata.
A irara é um animal carnívoro, mas adora frutos e mel. As aves são um espetáculo à parte. Vamos acompanhar o pesquisador Luciano Lima, ornitólogo do Museu de Zoologia da USP. Nossa equipe ganha reforços importantes.
O monitor ambiental Gilberto Teixeira Rodrigues, também conhecido como Betinho, é o mais requisitado observador de passarinho da região. Ele consegue olhar para onde ninguém vê nada e avistar passarinhos. Será um dom? “É um dom e a gente está treinado aqui na Mata Atlântica”, responde.
Eles são mateiros de primeira. Mestres da floresta. O monitor ambiental Luís Avelino avisa que fala usando o nome científico das aves. “Tem o Tangara seledon...”, começa.
Ele explica como aprendeu a decorar nomes tão difíceis: “Eu estudei um pouco os livros e vi os observadores de aves estrangeiros virem aqui no parque.”
No fim da tarde, Luciano e Betinho entram na mata para escolher o lugar em que vamos trabalhar cedo no dia seguinte.
A quantidade é imensa, a diversidade também é muito grande. Mas quantas espécies de pássaros existem de verdade na Mata Atlântica? Essa espécie de censo que o biólogo, com a ajuda de Betinho, está fazendo. Ele está armando uma rede para capturar os pássaros e saber quantos são.
Quando o dia começa a clarear, voltamos para trilha, onde está a rede dos pássaros. Antes mesmo de ver os passarinhos, os pesquisadores já ouvem o canto dos pássaros.
“Quando você está parado em um ponto desse da mata, em cerca de cinco minutos consegue ouvir até 30 espécies de aves”, diz Luciano.
É um mundo invisível, mas sonoro. É ver para crer. Betinho consegue imitar vários pássaros. Ele faz algumas demonstrações e arranca um elogio de Luciano: “Perfeito. É um playback ambulante”, ri.
Caiu na rede, é passarinho: depois de um tempo, capturamos a primeira ave da manhã: um flautim. A rede não machuca a ave. Luciano anota o peso e medidas.
“O interessante é que a anilha fica no pé do animal, mas ela não aperta. Fica solta, roda de um jeito que não machuca o animal. É como se fosse um bracelete”, explica. Ele mostra que a técnica correta para soltar o passarinho é simplesmente abrir a mão e dar uma assoprada. “Tomara que a gente consiga recapturar ele daqui a algum tempo para dar mais dados para nossa pesquisa.”
Ao longo da manhã, vimos de bem perto pássaros lindos, como o tangará dançarino. “É típico da Mata Atlântica. É um bicho que só existe na Mata Atlântica”, aponta Luciano. Ele mostra também que, por baixo da crista marrom, um passarinho revela uma cor amarelada.
“As memórias que eu tenho da minha infância, no sul de Minas Gerais, na casa dos meus avós, eu era sempre envolvido correndo atrás de pássaros. Eu caçava passarinho com estilingue e botava em gaiola. Quando eu tinha por volta de 13 anos, eu estava na sexta série e teve uma feira de profissões no meu colégio. Eu pensei: ‘Se é possível viver de ver passarinho, eu quero viver de ver passarinho’”, lembra Luciano. “Itatiaia foi onde eu comecei minha fissura, minha paixão pelas aves. No começo, eu levava meu irmão, com binóculo pendurado no pescoço, e saía procurando os passarinhos. Não demorou para que as pessoas começassem a me chamar de menino passarinho.”
E, assim, nossa expedição vai até o Parque Nacional de Itatiaia, o primeiro a ser criado no Brasil, há quase 75 anos. O estilingue de Luciano, agora, serve para lançar a corda da rede nos galhos mais altos. A Mata Atlântica é uma floresta em camadas.
“Os ambientes são bem diferentes, na luminosidade e nas espécies de plantas. Por isso que as espécies que vivem no alto não vivem no baixo. Eles se especializam e acabam dividindo a floresta. Essa é uma das justificativas para a grande biodiversidade que existe na Mata Atlântica”, diz Luciano.
E é justamente na copa das árvores que queremos chegar. “É a primeira vez que colocamos a rede de bandeira em Itatiaia. É uma técnica muito pouco utilizada no Brasil, porque dá uma logística bem complicada de levantar”, diz Luciano. “No momento, a lista de aves do parque está em torno de 380 espécies. O Itatiaia é o paraíso das aves.”
Se é assim, vamos botar o menino passarinho para voar no balão e observar de outro ângulo os pássaros que ele só vê por baixo. Nossa equipe vai se dividir. Junto com Sergio Chapelin, um grupo vai acompanhar por terra o voo do balão. “Prefiro ficar aqui com o pezinho no chão”, brinca Chapelin. O repórter André Luiz Azevedo vai embarcar com Luciano.
Às 6h20 da manhã, o balão do Globo Repórter começa a decolar para a expedição nos céus do Brasil para mostrar o cenário deslumbrante da Mata Atlântica.
“A copa das árvores é o lugar onde os cientistas mais demoraram a chegar. A gente conhece lugares tão distantes, como a Lua, mas a copa de muitas florestas do Brasil ainda permanecem completamente inexploradas”, reflete Luciano no ar, olhando a paisagem verde abaixo. “É justamente o visual dos grandes predadores, dos grandes gaviões. Eles têm justamente esse visual da copa das árvores, onde eles espreitam vários tipos de presas diferentes.”
Um gavião passa voando. Luciano diz que é o gavião de cauda branca. “É um bicho que vive justamente na transição entre a floresta e áreas abertas.”
André Luiz Azevedo conversa com Sergio Chapelin pelo rádio. “Está um voo em céu de brigadeiro! Muito tranquilo.” Observando a sombra que o balão faz sobre a mata, o repórter compara: “Lembra até um coração.”
Chapelin avisa que está indo ao encontro de André.
Na hora do pouso, Feodor pede para Luciano dar uma mãozinha. Ele desce e puxa o balão para uma área mais segura. A equipe de resgate chega ao mesmo tempo em que o repórter.
Chapelin pergunta se valeu a pena. “Foi um voo realmente espetacular. A técnica funcionou, a sorte ajudou também”, responde André Luiz Azevedo, que conta que os barulhos da selva não têm significado para os leigos, mas que Luciano consegue identificar os pássaros que os produzem. “Já está com o ouvido treinado”, observa Sergio Chapelin.

Coisa de menino. Menino passarinho.

Fonte:http://g1.globo.com/globo-reporter/noticia/2011/11/

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